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 Violência psicológica no BBB 23, é crime? Doutora em Direito penal Gisela França explica

Divulgação TV Globo

Frase abre discussão sobre machismo: “Jajá você vai levar umas cotoveladas na boca” ditas por Gabriel a participante Bruna Griphao foi um dos assuntos mais comentados na WEB

No último domingo(24), foi exibido mais um programa de formação de paredão do BBB 23, mas a pauta do reality foram as cenas veiculadas do casal Bruna e Gabriel que estão tendo um relacionamento afetivo e as imagens mostraram o rapaz interrompendo a sister não a deixando falar, ridicularizando parte de seu corpo, e até utilizando palavras grosseiras e em tom ameaçador, como: “Você vai levar umas cotoveladas na boca”. O programa teve algo peculiar neste domingo: o recado vindo de Thadeu Schmidt,   fez um alerta ao vivo ao casal.

(…) Estou aqui para fazer um alerta antes que seja tarde. Quem está envolvido em um relacionamento, talvez nem perceba, ache que é normal. Mas quem tá de fora consegue enxergar quando os limites estão prestes a serem gravemente ultrapassados. Olha esse diálogo que aconteceu ontem. Bruna falando: ‘Eu sou o homem da relação’. Gabriel falando: ‘Mas já já você vai tomar umas cotoveladas na boca’. Gabriel, em uma relação afetiva, certas coisas não podem ser ditas nem de brincadeira. Esse é o recado que eu queria deixar para vocês’’, disparou Tadeu em um dos trechos.

 O apresentador parafraseou trechos do programa com a finalidade de alertar o casal, Bruna e Gabriel sobre os rumos que poderiam tomar o relacionamento, conversamos com a Dra. Gisela França que é  Doutora em Direito Penal pela UERJ. Profa. de Ciências Criminais e Segurança Pública da UERJ e Profa. da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro EMERJ para esclarecermos este assunto que é comum, porém pouco notificado por falta de informação.

“Olhando-se em perspectiva para nossa infância e adolescência,  anos 70/80,  podemos perceber que, apesar das conquistas femininas da década de 60, o machismo estrutural fazia parte da educação,  não havia consciência de toxicidade e  do potencial altamente lesivo das  agressões psicológicas,  mais sutis, insidiosas, Aliás,  muitas mulheres eram vítimas de agressões físicas constantemente e isso também era tolerado, tanto é que a Lei Maria da Penha só foi editada recentemente”. Assim, Gisela inicia sua análise. 

Na concepção da Doutora em Direito Penal, Gisela França da Costa ,”Para que haja violência psicológica não é necessário que estejamos dentro de uma relação onde a mulher corresponde ao estereótipo da vítima desse tipo de crime…uma mulher fragilizada, calada, submissa ou atemorizada. Mulheres de temperamento forte e independentes são igualmente vitimadas e muitas vezes possuem enormes dificuldades em se identificarem e perceberem como violentadas e agredidas afirma a Drª Gisela; e acrescenta que as cenas exibidas pela emissora no BBB 23 do casal Gabriel e Bruna configuram, em tese, violência psicológica contra a mulher, que é uma das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher definida no artigo 7º, II, da Lei Maria da Penha.

Mulheres que sofrem com a violência psicológica poderão ter um prejuízo em sua saúde mental, problemas como depressão, fobias, pânico, estresse pós traumático, baixa autoestima, ideias de suicídio, consumo abusivo de álcool e drogas dentre outros problemas psicológicos ou psiquiátricos. 

Logo, essas condutas que as vitimam, devem ser combatidas e por isso são criminosas. A violência psicológica pode causar consequências irreversíveis para a vida da mulher, afirmou Gisela França.

Em muitas ocasiões a  violência psicológica  acaba passando despercebida pelas mulheres que são suas vítimas, caracterizando-se como uma violência silenciosa, pois atinge a subjetividade feminina e ocasiona danos internos que poderão acarretar uma infinidade de doenças e prejuízos à existência dessas mulheres. E o direito penal não está alheio a isso na medida em que editou a Lei 14.188, de 2021, que criminaliza a conduta do abuso psicológico. No período de 2011 a 2021 foram mais de 655 mil casos notificados de violência psicológica no Brasil, representando 21,3% de todas as violências registradas no DATASUS. 

“Existe uma dificuldade da mulher se identificar como vítima, e perceber as condutas agressivas de seus companheiros ficando à mercê dos agressores.  As mulheres precisam perceber as nuances no tratamento ao qual estão submetidas pelos seus parceiros. Devem ser protagonistas nas suas trajetórias de vida e em evitarem que essas condutas continuem sendo praticadas. É fundamental que elas, dentro de suas relações afetivas, tenham essa percepção no tratamento que seus parceiros lhes dispensam, com a finalidade de identificarem e impedirem a prática da violência psicológica assim que ela manifestar, mesmo que na  forma, inicial, de tratamentos grosseiros cotidianos, que acendem o sinal amarelo de alerta” Gisela França

A violência psicológica contra a mulher é uma das formas de violência doméstica e familiar contra a mulher definida no artigo 7º, II, da Lei Maria da Penha, vejamos:

“Qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação”.

Importante mencionar que há relação abusiva mesmo sendo a vítima uma mulher aparentemente forte e que rebate as agressões verbais. 

Ao não perceber que está sendo manipulada, agredida, diminuída, menosprezada,  ela se coloca num lugar de extrema vulnerabilidade, pois resta indefesa; e permite que as agressões se intensifiquem e possam chegar às agressões físicas e mesmo ao feminicídio,  acrescenta Gisela França.

Este tipo de comportamento masculino requer uma atenção triplicada por todas nós mulheres, pois acende um sinal vermelho, ao pensarmos juridicamente que a  Lei 14.188/21, faz a previsão e inclusão no código penal da violência psicológica contra mulher 147-B, percebemos a importância da temática. No Código Penal é crime Causar dano emocional à mulher que a prejudique e perturbe seu pleno desenvolvimento ou que vise a degradar ou a controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que cause prejuízo à sua saúde psicológica e autodeterminação. A pena estabelecida para o crime de violência psicológica contra a mulher é de reclusão, prisão, de seis meses a dois anos e multa.

Gisela França ainda menciona que qualquer mecanismo semelhante a isso pode tipificar a violência contra mulher como: interrupção constante da fala, desqualificação, apelidos que denotem menosprezo, ameaça veladas, ridicularização, tudo isso, que demonstre um comportamento que começa por meio de palavras, pequenas atitudes que às vezes as vítimas não perecem como agressão. Não podemos dizer que essas condutas do participante Gabriel poderiam escalonar e chegar a um feminicídio,  seria especulativo, contudo podemos dizer, sem medo de errar, que os feminicídios, em regra, não começam com aquelas atitudes que atingem diretamente a vida da mulher ou a integridade física da mulher. Em cerca de 90 % dos casos as agressões começam como verbais e psicológicas e vão crescendo, se intensificando. O comportamento passivo da mulher acaba permitindo que elas se convertam em agressões físicas, vão escalonando e podem culminar no feminicídio.

Assim, informação, autopercepção, empoderamento, redes de apoio e conhecimento dos seus próprios direitos caminham de mãos dadas no combate à violência contra a mulher, seja esta violência física, moral, psicológica, patrimonial etc.

Gisela França- Doutora em Direito Penal pela UERJ. Profa. de Ciências Criminais e Segurança Pública da UERJ e Profa. da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro EMERJ

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